Capítulo 14
Jasper desapareceu na névoa da praça, me sentei em um banco do lado do caminho de terra e repousei. Esperando que algum bandido enfiasse uma faca em meu pescoço.
Diferente do que eu pensava, não havia ninguém na praça, não onde eu estava. Passavam alguns morcegos que eu percebia por conta da iluminação do poste, que piscava e apagava de vez em quando.
Mas em um momento, o de vez em quando tornou-se recorrente. As luzes foram piscando e apagando-se uma por uma, até um ponto onde estava tudo escuro.
O breu me impedia de enxergar minhas mãos, eu sentia o vento forte bater em meu rosto. Mas de uma forma repentina, quando pisquei, o vento parou imediatamente. A praça parecia ter parado no tempo, não havia sequer um som.
Nenhuma buzina, nenhum passo, nenhum cachorro latindo, só um silêncio denso e sufocante. Ficou tudo preto. Preto de verdade.
Me levantei, procurando qualquer sinal de sentido, mas caí tentando andar e tropeçando.
No instante que caio no chão, sinto a terra pulsando, como algo vivo. Como carne, como se eu tivesse em cima de um coração batendo.
Me virei para levantar, mas aí vi. Primeiro uma luz, branca azulada que iluminou o mundo inteiro e me cegou por um momento, que conseguia iluminar tudo e concentrar-se em um lugar só ao mesmo tempo.
No meio da praça, em minha frente.. Ele apareceu.
O anjo, Gabriel.
Não sei como eu soube. Eu simplesmente.. soube, era ele. Os olhos dele tinham algo não humano. Assim como cabiam milagres da vida, cabiam cidades queimando. Cabia a vida e a morte ao mesmo tempo em seus olhos.
Suas asas pareciam um vitral, elas estavam completamente abertas. Seu rosto era jovem, estava em vestes brancas e seus cabelos eram loiros como os meus, longos, porém arrumados e penteados de forma perfeita.
Quando falou, além de falar pela boca, falou pelas árvores, pelo chão, pelo céu, pela água, porém, somente eu ouvi.
— Você não é real e Deus não existe, eu não te chamei. — Eu disse me afastando lentamente.
As árvores começaram a chorar, gotas de sangue escorriam.
— Eric. Você me chamou com a sua hesitação. Por que pensa que a violência não o satisfaz como antes satisfazia?
— Não sei, você é um delírio.
— Deus está te dando uma chance.
— Deus não existe, se existisse e fosse onipotente, não colocaria um ser tão vil como eu em sua criação. Caso ele exista, eu o culpo pela minha criação. — Gabriel zangou-se. — Se ele me criou, ele deveria saber o que eu me tornaria.
— Sabia e sabe, como sabe que irá se redimir. — Gabriel disse. — Deus já te deu muitas chances, pare de pecar e torne-se um com o divino.
Me calei, tudo começou a voltar ao normal e Gabriel subiu aos céus como um tiro, não sobrando nada, nem ao menos uma pena de suas asas.
A praça estava normal, assim como os postes que posteriormente estavam apagados, estavam acesos e brilhantes.
Eu me levantei do chão e saí marchando da praça, minha cabeça pesava tal qual uma bigorna.
Ainda não eram nove horas, eu estava andando em direção a casa, um encontro inesperado ocorreu em L’Ombre, a rua onde as mulheres se vendem.
Haviam prostitutas em todo canto, o cheiro do cigarro que elas tragavam misturado com cachaça tomava conta do ambiente, maldito o homem que paga uma mulher para o satisfazer.
Trotando pela calçada que estava silenciosa — Porém cheia. — Porém, algo penetrou e ecoou a rua inteira, cortando o silêncio como uma adaga.
Um grito feminino vindo do quarto andar de um apartamento de tijolos, o que atraiu a atenção das prostitutas. Ao olhar para cima, um rosto pálido familiar gritava pela janela, enquanto um homem gordo e calvo a segurava pelos cabelos ruivos.
Claryce.
Ela me viu de cima para baixo e começou a pedir socorro, eu corri para dentro do apartamento e subi as escadas desamarrando a clava, que pensei não ter de usá-la mais.
Corri até o final do corredor e me posicionei atrás da porta.
Em fúria, dei um chute forte perto da maçaneta, o que quebrou a madeira podre da porta em um buraco. Continuei chutando e enfiei meu braço dentro do furo, abrindo-a por dentro.
Entrei no apartamento que estava com cheiro de mofo e abri a porta do quarto, Claryce estava parcialmente nua com as roupas rasgadas, enquanto um homem extremamente obeso de regata branca suja e bermuda azul listrada a batia e chutava.
— Não se mete nisso garoto, essa putinha aqui não é quem você pensa, ela é um diabo! — Claryce chorava cheia de hematomas em seu rosto, implorando piedade. — Quem mandou fazer trabalho mal feito!
Sem pensar muito, levantei a clava e comecei a lutar contra o homem, ele soltou Claryce e partiu pra cima de mim com um soco, que devido a sua obesidade foi lento, me permitindo desviar.
Eu desci a clava contra seu braço estendido, abrindo uma ferida o fazendo gemer.
Depois fui para as suas costas e comecei a golpear freneticamente a parte de trás de sua cabeça com a clava, jorrando sangue e fragmentos de ossos para todo lado.
Eu bati até que sua cabeça explodisse, com fragmentos de carne e osso no chão, pedaços de seu cérebro ficaram grudados na minha clava. Seus olhos estavam saindo para fora, numa convulsão, mordeu e arrancou a própria língua com os dentes.
Claryce estava espantada vendo a cena, se perguntando o por que de eu ter feito isso com tanta brutalidade.
Terminei o serviço esmagando seu rosto, até que sua cabeça se reduzisse a um pequeno pedaço vermelho.
Olhei pra Claryce, ela havia se afastado até o canto do quarto, não com medo do homem, com medo de mim.

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