Capítulo 16
Bom dia, irmãos. Os raios de sol me acordaram, felizmente meu sono é muito frágil, eu acordo com uma mosca pousando em meu rosto.
Esqueci de documentar, irmãos. Claryce ontem me deu um papel com um endereço e um nome. Dizia ser de um homem fanático católico, como teólogo ou algo assim, ordenou que eu falasse com ele.
Pelo visto era seminarista, ela o descreveu como um sujeito peculiar, sua boca era como uma chaminé e isso o prejudicava, de acordo com Claryce, estava lentamente morrendo de tuberculose.
Estarei indo ao endereço agora, de manhã. No bilhete dizia:
“Holderlin.
Rua Hermes, 19.”
Holderlin, seu sobrenome.
Eu vesti minhas roupas, vestia uma calça jeans azul claro larga, botas pretas militares, uma camisa preta social e coloquei o sobretudo do meu pai. Achei o sobretudo necessário pois acredito que o tal Holderlin seja burguês, quero passa uma boa impressão.
Ao que tudo indica, ele mora fora da cidade. De acordo com Claryce, Holderlin pensava que “Apenas o homem desconectado da sociedade atinge a paz.” É um pensamento interessante, foi por esse pensamento que eu resolvi me encontrar com Holderlin.
Antes de sair de casa, me olhei no espelho do banheiro. Desde a morte de minha mãe sinto que minha aparência vem piorando. Começaram a aparecer algumas manchas escuras em minha pele, minhas olheiras escureceram e aumentaram de forma significante e minha pálpebra direita cobre agora metade do meu olho, esse meu problema piora a cada dia. Minha visão está sendo prejudicada, minha aparência também.
Vejo que ao redor do meu nariz há pequenas áreas vermelhas, o que nunca me ocorreu, espero que não seja grave.
Tiro minha camisa para analisar meu corpo, eu emagreci muito desde a morte de minha mãe.
Minhas costelas pulam para fora do meu peito basicamente. Meu abdômen parece que será engolido a qualquer momento, que seja!
Não aguento a vista e visto a minha camisa e o sobretudo, tiro da gaveta minha pistola e a ajusto no bolso interno do sobretudo.
Saio de casa marchando em direção ao ponto de ônibus, de acordo com Claryce: Pego o ônibus para Saint Peter, depois para Meadow, e ando até a Rua Hermes, sua casa é a de número 19, no fim da rua.
A rua L’Écorce estava brilhando com o sol da manhã, as copas das árvores estavam balançando com o vento, o asfalto estava amarelado com a luz do sol.
Fiz questão de observar isso, talvez hoje fosse o primeiro dia realmente bonito na rua onde moro, cheguei a ver um pássaro entrando dentro de uma árvore, coisa que não via há meses.
Caminhei de forma lenta até o ponto de ônibus de Astastheran, analisando e observando o meu redor, vi também o apartamento onde Jasper morava, o mesmo onde estava aquela pichação “The Hollow Men”. A propósito, nessas semanas onde não escrevi, surgiu uma nova pichação por aqui. Fica na frente do edifício onde moro.
Escrito “Intelligentsia” com letras vermelhas e agressivas, pelo nome, não me parece ser uma gangue.
Enquanto divagava, pensando na vida, fui assustado por um sujeito esquisito que pisou forte no chão da minha frente, não vi muito bem por conta da rapidez do pulo que eu dei para trás.
O som das minhas botas batendo no chão ecoaram pela rua vazia e iluminada. Quando abaixei a cabeça para olhar, era Jasper com seu sorriso amarelado que atravessava seu rosto.
Estava com uma calça larga preta, uma camisa cinza e uma jaqueta um tanto apertada.
— Bom dia, meu querido! — Jasper disse de forma divertida tocando meu ombro. — Por que acordou cedo, hein?
— Tenho compromisso. — Respondi com frieza, não estava contente com Jasper.
— Compromisso? Eita, burguês! Olha quem está todo arrumado! — Ele saltitava e gargalhava apontando pra mim. — Todo “frufruzinho”! Vai se encontrar com aquela puta do prédio?
Empalideci subitamente.
— C-Como assim? — Perguntei.
— É! É! Aquela ruivinha que você “Salvou” ontem!
— Como sabe disso, seu merdinha?
— Estava atrás de você o tempo todo! Desde quando você ajuda as mulheres? — Ele dizia, quase me repreendendo. — É o que eu te digo, amigo. As dúvidas nós esmagamos.
Calei-me
— Me encontra na minha casa quando chegar desse seu “Compromisso” — Ele debochou. — É ali ó! — Ele apontou para o apartamento onde morava, como se eu já não soubesse.
— Tchau.
— Au revoir!
Eu tirei Jasper do meu caminho e segui, quando eu desci do ônibus em Saint Peter, me encontrei com um homem tocando violão, estava sentado de pernas cruzadas em um edifício de tijolos.
Não parecia um mendigo, estava com uma camisa social preta, uma gravata preta e um colete camuflado de pesca.
Tocava uma melodia agradável, havia um chapéu do seu lado, com algumas moedas.
Como gostei da melodia, saquei do bolso 4 moedas e joguei em seu chapéu, ele acenou com a cabeça.
Ele continuou batendo nas cordas de seu violão e cantando, agradável.
O segundo ônibus, para Meadow, parou em minha frente e as portas se abriram, entrei e me sentei, o ônibus partiu.
No ônibus não haviam muitas pessoas, apenas alguns sujeitos e senhoras que repousavam no fundo do transporte.
Até Meadow foram-se 10 minutos, desci junto de todos que estavam a bordo.
Meadow era o lugar mais peculiar da cidade com certeza, era um bairro cheio de degenerados de todos os tipos.
Haviam drogados, maníacos, ladrões e a maioria das coisas ruins.
Era também um bairro com uma grande quantidade de muçulmanos refugiados, ao lado do ponto de ônibus, haviam três homens com barbas cheias repousados em cima de um tapete que estava estirado pela calçada, quem passava evitava pisar em cima.
Usavam túnicas, lenços na cabeça e riam entre si em uma língua que eu não compreendia.
Ao centro, um narguilé alto, vermelho, ornamentado em ouro. Soltava da mangueira fumaça espessa, aromática, que perfumava o ar.
Parei na frente deles com um sorriso, se calaram, o mais velho ergueu o olhar e acenou, gentilmente.
— Posso..? — Murmurei, apontando para o narguilé e sorrindo.
O mais jovem sorriu e fez que sim com a cabeça, antes de me entregar a mangueira, me fez sentar de pernas cruzadas no tapete.
Inalei.
O gosto era diferente. Doce, me lembrava âmbar, mas isso não era importante pois, na exalação, tudo, repito, tudo mudou.
O mundo desacelerou. O ruído da cidade cessou. Minha visão estava mais clara, o céu parecia mais azul, e tudo imóvel, era engraçado.
Estava rindo comigo mesmo enquanto os homens riam mais ainda dividindo a mangueira, seus rostos se tornaram algo como um mosaico, fragmentos.
— Tem alguma coisa nisso! — Eu disse rindo alto e dando tapinhas nas costas do mais jovem, que sentava do meu lado.
De novo, inalei a fumaça e passei a mangueira pro lado. Eu me sentia no deserto, dentro de uma cabana com diversos líderes religiosos, uma melodia tradicional árabe ecoava na minha cabeça.
Me senti flutuando, mas quando olhava, estava parado no mesmo lugar onde sentei.
Aquilo era hilário para nós, estávamos todos gargalhando, os transeuntes passavam apressados olhando e julgando, que morram!
Por um instante, eu achei que iria entender tudo. Tive a impressão de que entenderia agora Deus, Allah ou Brahman.
Mas aquela verdade evaporou no céu com a fumaça, e então tudo voltou a ser o que era. Concreto rachado, cheiro de óleo e carros passando.
Me levantei sorrindo. O mais velho me encarou e tocou o peito com a mão, depois apontou para o céu e me benzeu. Eu assenti, mesmo sem entender.
— Fi Aman-Allah! — Eles se despediam.
Continuei meu caminho, andando, flutuando, até a Rua Hermes. Irmãos, a rua contrastava em demasia com o bairro.
Diferente daquele bairro pobre, a rua consistia de árvores e mansões, estendia-se até onde não podia ver, aqui vejo a diferença de classes em Londres.
Os tijolos se alinhavam perfeitamente na calçada, eram tijolos brancos e vermelhos que se encaixavam perfeitamente.
O asfalto não tinha buracos, era liso, como se nunca houvesse passado um carro por ali.
Divagava em direção à residência de Holderlin, de número 19. Havia Ipês e diversas outras árvores que criavam sombra na calçada.
Eu estava em frente a mansão de Holderlin, era algo enorme. Em minha vida inteira nunca entrei em algum lugar semelhante a esse.
O portão de barras de ferro, alto como um edifício, rangeu quando o abri empurrando. Por trás dele, uma alameda de Buganvílias se estendia até a porta da mansão, que era como um mausoléu barroco.
Em ambos os lados havia um jardim extremamente verde, um silêncio e paz absoluta.
A porta principal, de madeira maciça, era adornada por entalhes diversos, antes de tocar a campainha reparei nos machados, cobras, cruzes e flores entalhadas na madeira.
Meu dedo afundou na campainha, emitindo um barulho de sino, demorou aproximadamente cinco segundos até que eu ouvi o eco de passos leves…

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